"Trauma"
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Invasão

"… e então, quinze minutos depois, a Equipe de Assalto criou uma abertura e entrou," concluiu Bullfrog. "E foi isso."

"Foi mesmo?" perguntou a mulher de suéter azul.

O homem olhou para a xícara de café em suas mãos por um longo e silencioso momento.

"Agente," disse a mulher. "Quero você e sua equipe de volta aqui amanhã de manhã para outra sessão de depoimentos. Até lá, estarei retirando vocês da escala de serviço ativo."

"Se você achar que é necessário."

"Eu acho. E agente?"

"Sim?"

A mulher de suéter azul suspirou. "Tente descansar um pouco."


Bullfrog dirigiu direto para casa em seu apartamento após o interrogatório, subindo as escadas cansado com sua mochila sobre um ombro. Ele destrancou a porta e entrou, para se encontrar cercado pela luz de velas. O cheiro de perfume estava impregnado no ar, permeado por sons calmos de música jazz suave.

Havia uma mulher ruiva linda e diminuta sentada no sofá. Fox sorriu para ele enquanto estendia os braços sobre a cabeça. "Ei, grandalhão!" disse ela, atrevida, andando vagarosamente e segurando a gravata dele. "Fiquei com a semana de folga, então pensei em fazer uma surpresa para você!"

Ela estendeu a mão e o beijou carinhosamente.

Bullfrog sentiu a bile subir. Ele a empurrou de lado, correu para o banheiro e vomitou no vaso sanitário.


"… desculpe," disse ele mais tarde, depois que Fox apagou todas as velas, acendeu as luzes e vestiu roupas mais confortáveis.

"Desculpas aceitas," disse a líder da equipe de Assalto, "desde que você me diga o que diabos está acontecendo, Bull."

"Não quero falar sobre isso," insistiu Bullfrog. "É relacionado ao trabalho. Autorizações de segurança e tudo mais. Base da confidencialidade."

"Bull," disse Fox severamente. "Sou eu. Kate. Tenho a mesma autorização de segurança que você tem. E considerando que voei doze horas da Irlanda, sem falar em me depilar e me aparar para esta noite… acho que tenho o direito de saber."

"Kate…"

"E mais do que isso, Jerry… parece que você tem uma necessidade séria de contar," disse Fox, pegando sua xícara de chá e tomando um gole. "Então fale."

Houve um longo momento de silêncio antes que Bullfrog falasse novamente. "Você sabe que acabei de voltar do campo, certo?"

"Ontem, sim. Alguma operação no centro? Não ouvi os detalhes, mas o cara da recepção me disse que sua equipe teve problemas. Por isso achei que você precisaria de um pouco de ânimo."

"Sim. No centro," murmurou Bullfrog. "Hotel de luxo. Lugar chique. Recebemos a ligação assim que o PALISADE interrompeu uma ligação de emergência muito estranha do concierge. Eles nos mobilizaram, nos colocaram em trajes de isolamento e nos enviaram. A primeira coisa que aconteceu foi que esse velho gordo veio atrás de mim com um guarda-sol… "


"Jesus Cristo!" gritou Bullfrog quando o veterano investiu contra ele com a pesada mobília de piscina. "Se acalme! Nós somos os mocinhos!"

"Saia de perto de mim, seu comunista desgraçado!" o velho banguela gritou. Ele continuou a tentar bater descontroladamente com o guarda-sol neles, seu pau enrugado balançando suavemente para frente e para trás a cada ataque. "Você nunca vai me levar vivo, Ivan!"

"Skunkboy, pegue ele!" gritou Bullfrog.

"Vá se foder! Faça você isso! Não vou agarrar aquele cara!"

Kitten calmamente caminhou até o velho nu, pegou o guarda-sol com uma das mãos e casualmente estendeu a mão para socá-lo no queixo, com força.

"Jesus, Kitten! Você poderia ter matado ele!"

Kitten olhou para o velho nu inconsciente em seus braços, verificou em busca de puslso e encolheu os ombros. "Ele vai viver."

"Me pergunto o que diabos foi isso?" perguntou Skunkboy.

"Talvez ele tenha tido uma noite ruim no bingo," brincou Bullfrog.


A equipe parou de rir assim que encontraram o salão principal.

"Bullfrog?"

"Sim?"

"Esse é o inferno?"

"Se não for, é o mais próximo que podemos chegar," disse Bullfrog com uma carranca. Ele se abaixou e passou os dedos pelos olhos do homem nu deitado no chão do salão. Sua pele havia sido arrancada de cada centímetro de seu corpo e fixada no tapete com lápis afiados. Um pênis e testículos decepados estavam próximos à cabeça. O ferimento de bala no meio da testa não estava lá quando a equipe entrou na sala: Bullfrog o fez no momento em que percebeu que o homem ainda estava vivo (além de remover a genitália decepada do homem de sua boca).

"Skunkboy, análise de toxinas?"

"Nada que eu possa ver." O jovem balançava a varinha de amostragem no ar e estudava a leitura em sua tela. "Nada de psicoativos. Muita adrenalina, sangue, merda, urina, saliva… isso é esperado, dado o que estamos vendo aqui."

Bullfrog olhou para o resto da sala de conferências. O lugar inteiro estava cheio deles: centenas, senão milhares, de homens, mulheres e crianças em trajes de férias de cores vivas tombados na morte. Aqui, um jovem tinha agarrado uma jovem loira pelo pescoço e estrangulado ela até a morte antes de ser esfaqueado nas costas por outra mulher com um canivete, que estava deitada no chão sem vida olhando para o nada, seus olhos vidrados na morte, a bainha de sua saia manchada com merda e urina. Lá, uma mulher de quarenta anos deu um soco no rosto de um homem de cabelos grisalhos antes de quebrar sua cabeça com um liquidificador de bar. Ali, um menino estava encolhido no canto da sala. Seu braço decepado em seu colo.

"Bem, se não é uma toxina… Spider, análise taumatológica?"

"Tendendo a um Plano sólido, intensidade em torno de cem kilocaspers… tonalidade Safira, textura Apertado," relatou Spider. "Não tenho certeza se isso é por causa do grande número de pessoas mortas por aqui, ou o que causou isso. Só para garantir, eu recomendo que todos nós nos mantenhamos de bico fechado. Só no caso de isso acabar sendo cognitivo ou memético."

"Sem discussão aí. Kitten? Você tem estado quieta," disse Bullfrog.

"… Eu digo para sairmos e queimarmos este lugar," disse Kitten secamente. Ela olhou para um jovem caído em um canto com os braços e as pernas estourados, verificou se tinha pulso, e então, casual e friamente colocou uma bala em sua cabeça. "É a única maneira de ter certeza."

"Seria melhor se só fizéssemos isso. Não há jeito algum que qualquer nível de limpeza a vapor torne esses tapetes higiênicos," ressaltou Skunkboy. "Você sabe o que dizem sobre o cheiro de cadáveres." Ele moveu seu peso no tapete encharcado. O tapete fez barulhos molhados sob seus pés.

"Então são dois votos para queimar o prédio. Spider? Sua opinião?"

"Espere um segundo." Disse Spider. Ela olhava para a tela de computador, engolindo em seco, enquanto brincava com o monitor. "Bull? Eu, uh… estou recebendo um monte de assinaturas VERITAS da suíte da cobertura no último andar," disse ela. "Parece que podemos ter um bando de civis ou reféns escondidos lá."

"Certo. Bora lá resgatá-los," disse Bullfrog. "Encontre um jeito de anular o elevador e bora entrar naquela suíte de cobertura."


"Ei, Bull?" perguntou Skunkboy no elevador.

"Hm?"

"Este lugar não recebe muitos turistas japoneses?"

"O que você é, a porra de um racista? Peça desculpas à Spider."

"Merda, desculpe, Spider, não é isso. É só que… bem, este lugar recebe muitos turistas japoneses nesta época do ano, certo?"

"Acho que sim. O registro de hóspedes tinha muitos Tanakas e Kims, sim."

"Mas metade dos caras mortos naquele salão não eram, certo?" aponto Skunkboy. "Na verdade, acho que a maioria deles eram brancos, negros ou hispânicos. Não é um pouco estranho?"

Bullfrog franziu a testa enquanto esfregava o queixo de forma pensativa. A luva reforçada de seu traje iso fazia um tilintar forte e metálico contra o painel frontal de seu traje. "Spider?"

"Sim?"

"Me mostre aquela leitura de radição de aspecto de novo."

Spider passou o tablet para o seu líder de equipe, que inclinou a cabeça para o lado por um momento e olhou para o padrão de cores e linhas na tela. De repente, Bullfrog praguejou, largou o computador e abriu o circuito de comunicação.

"Central, aqui é a Sparkplug!" ele praticamente gritou em seu microfone. "Estamos indo sem armas e atacando a suíte da cobertura! Caso Bixby, repito, Caso Bixby!"

"Cacete!" gritou Skunkboy. Ele se atrapalhou com seu rifle enquanto tentava enfiar a munição na câmara. "Puta merda!"

"Meus deuses," sussurrou Spider. Ela começou a vasculhar seu cinto tático.

Houve um ding! alegre, e as portas do elevador se abriram para…


Os foguetes de sinalização explodiam no alto, iluminando toda a selva em forte luz branca. Jeremiah sentiu um nó frio e forte na boca do estômago ao ver os vietnamitas em seus pijamas negros rastejando pelo arame.

"CARTER!" gritou seu tenente. "Levante aquela Ponto Sessenta!"

Ele se atrapalhou recarregando sua metralhadora, eventualmente conseguindo travar e recarregar a arma. Ele se ergueu até a borda da trincheira e abriu fogo, gritando de terror e raiva. A arma gritava e espalhava latão e aço quente por toda a lama vermelha da selva enquanto os clarões do cano iluminavam a noite.

Ele podia ver os vietnamitas caindo, podia vê-los morrendo e queria rir com a visão. "Tomem essa, seus chinocas de merda!" gritou ele. "VENHAM TOMAR, SEUS JAPINHAS DE MERDA!"

Ele viu o segundo conjunto de foguetes de sinalização subirem e viu seu tenenete se erguer das trincheiras, a pistola erguida sobre a cabeça, o rosto de barba grisalha contorcido de fúria. "AVANÇAR!" o tenente estava gritando. "Nós os colocamos em retirada! Peguem eles! Metam chumbo neles! Matem aqueles filhos da puta!"

Jeremiah se levantou e gritou de triunfo enquanto continuava a disparar sua metralhadora do quadril. Ele podia ver seus irmãos fuzileiros subindo das trincheiras, cortando a porra dos vietcongues como trigo com uma foice. O ferrolho da metralhadora bateu para trás assim que a munição se esgotou: ele entregou a arma ao atirador e tirou a .45 de seu cinto. Ele atirou na massa de desgraçados vestidos de preto em fuga, a fúria crescendo em seu coração. Como eles ousam! Como eles ousam arrastar o garotinho da mamãe Carter para fora de sua casa e levá-lo para a porra desta selva fedorenta? Como eles ousam?

Um dos japinhas estava gritando com ele. Ele colocou duas em seu peito e a pistola travou com uma câmara vazia. Ele podia ver mais dois de seus homens segurando a porra do chinês no chão. Ele pensou em recarregar sua pistola, mas levaria muito tempo. Ele bateu no rosto do filho da puta com o cabo da arma, arrancando aquele chapéu de palha idiota da cara dele, ficando surpreso ao ver que o chinoca desgraçado era uma mulher. Vadia desgraçada. Puta vietcongue da porra.

Ele se lembrou do pobre Hawkins. Bom garoto. Tinha acabado de fazer 18. Contratou uma prostituta para seu aniversário de dezoito. Prostituta trouxe uma granada para o tanque onde eles foderam, deixou ela para trás. Estourou a porra das tripas dele por todo o interior do veículo. Garoto bom da porra. Cara bacana, todo mundo gostava dele e ele morreu no meio da porra de uma rua em Saigon porque queria molhar o pau pela primeira vez. Porra de desperdício. Putas japinhas do caralho. Ele pegaria essa vadia por ele. Ele faria isso pelo Hawkins.

Ele podia sentir os outros japinhas tentando puxá-lo. Ele lutou contra eles e continuou socando a porra da puta na cara. Ele estava gritando, ele podia ver os hematomas surgindo… e então ela bateu algo em seu rosto, e ele pôde ver que era algum tipo de pé de coelho preso a uma corrente…


E então Bullfrog se viu deitado no chão da suíte da cobertura, agarrando Spider pela garganta. Seu rosto estava coberto de sangue e hematomas, e sua mão esquerda estava agarrada no pé de coelho da corrente que ela sempre usava em seu pescoço.

E Bullfrog gritou ainda mais alto.

Houve um grito repentino de alarme, e ele se virou para ver Kitten, fria, metódica e violentamente agarrando um homem velho de cabelos grisalhos camuflado pelo rosto e batendo sua cabeça contra uma bancada de granito. Seu rosto era uma máscara de fúria enquanto ela transformava a cabeça do homem em polpa.

Bullfrog olhou em volta em silêncio para a sala ensanguentada, para os homens, mulheres e crianças deitados em pilhas quebrados e ensanguentados no tapete, para os buracos de bala crivando as paredes e fazendo teias no vidro, para sua companheira de equipe quebrada, machucada e ensanguentada, e para o pente vazio de sua arma.

Pareceu-lhe que seria uma boa ideia simplesmente ir embora.

E assim ele o fez. Foram necessários quatro homens grandes para carregá-lo para fora da sala.


"… meu deus," sussurrou Fox. O chá dela havia esfriado com ela sentada no canto, assistindo Bullfrog contar sua história.

"É," disse o homem. Ele riu amargamente. "Minha equipe está uma bagunça. Spider está no hospital com as duas maçãs do rosto quebradas e uma caralhada de dentes quebrados. Ela tem sorte de estar viva. Kitten… enlouqueceu. Simplesmente continuou batendo o cara contra a bancada. Não havia mais nada da cabeça dele no final. Tiveram que sedá-la. O único que parecia ter passado bem por essa era o Skunkboy… pelo menos, foi o que pensei antes dele tentar me dar um soco no rosto."

"Lance deu um soco em você?"

"Me xingou também," admitiu Bullfrog. "Usou todo palavrão que sabia. Disse que quase fiz com que todos fosse mortos. E o problema é que ele estava certo."

"Bull…"

"Não. Não me interrompa, Kate. Eu estraguei tudo." O homem bateu com o punho na palma da mão aberta. "Perfil racial entre os alvos. Isso significava que o que quer que estava fazendo aquilo estava filtrando por raça. Isso implica agência. Controlador sapiente, não um efeito autônomo. E tinha o padrão VERITAS."

"Bull…"

"Eu deveria ter verificado o padrão antes de termos entrado naquele maldito elevador," continuou Bullfrog. "A Spider é uma novata. Ela não tem a experiência em ler assinaturas de VERITAS que tenho… que o Beagle tinha! Ela mal está na equipe há um ano! Ela não sabe como identificador um dobrador de mentes. Se eu soubesse que tinha um lá em cima, nunca teríamos entrado naquele maldito elevador!"

"Jerry…"

"DAI!" gritou Bullfrog. "Eu, o maldito IDIOTA, decidi invadir a porra daquela sala com QUATRO caras de Avaliação! No momento em que percebi que estávamos entrando no covil da porra de um dobrador de mentes, eu devia ter parado a porra do elevador: batido na parada de emergência, ligado e mandado uma Equipe de Assalto… mas não! Eu tinha de INVADIR! E mandei nós quatro entrarmos para nos tornarmos os brinquedos daquele maldito psicopata!"

Fox apertou sua caneca com mais força enquanto o discurso de Bullfrog continuava. "E a COISA MAIS FODIDA?" concluiu o homem. "Ainda mais fodida do que isso… aquele desgraçado doente me usando para quase matar minha própria companheira? A coisa mais fodida é que no final, a porra daquela novata salvou nossos traseiros! Se ela não tivesse pego sua proteção… se ela não tivesse quebrado o efeito sobre mim e os outros, nós teríamos nos matado exatamente como aqueles pobres desgraçados no salão principal! Meu deus!"

Bullfrog caiu no sofá e enterrou o rosto nas mãos, soltando um grito alto de frustração, abafado por suas próprias mãos.

Fox se sentou e colocou o braço em volta dos ombros dele. O homem se encolheu… então se acomodou e descansou a cabeça em seu peito. Demorou um longo tempo para sua respiração finalmente desacelerar.

"Jerry?"

"Sim?"

"Se lembra do que você me disse depois da operação no Alasca?"

"Não é a mesma coisa."

"É exatamente a mesma coisa, Jerry," disse Fox. "E eu vou te dizer a mesma coisa que você me disse."

"Você está todo fodido," Fox continuou. "E com razão. E você vai ficar fodido por um tempo. Merdas como essa não vão embora rápido. Pedaços disso nunca vão embora. Mas as bordas ásperas e dentadas… ela vão se suavizar. Vamos te ajudar a fazer isso. E no final… essa merda não vai te afetar tanto. Ainda vai doer… mas você será capaz de aguentar."

Bullfrog balançou a cabeça em silêncio enquanto esfregava a testa, olhando para o nada. Mas seus ombros não estavam tão tensos e seus olhos não estavam tão assombrados. Já era algo, pelo menos.

"Você deveria dormir um pouco," disse Fox. "Se eu conheço a Coalizão, eles vão querer você para uma terapia bem cedo."

"Oito da manhã," admitiu Bullfrog. "Terapia o dia todo e interrogatório com a equipe."

"Tudo bem," disse Fox. "Pronto para ir pra cama?"

"… não. Mas vou tentar."

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