Trégua


avaliação: 0+x
nam.png

Vietnã, 1969


Em seu tempo livre, Jai gostava de contar o número de chapéus de palha balançando sobre os arrozais. Cada chapéu pertencia a um fazendeiro que trabalhava diligentemente e não prestava atenção ao pelotão de fuzileiros navais de passagem. Ele avistou cerca de vinte deles agora que saíram das árvores e começaram a se aproximar da aldeia à frente.

Lugares como esses estavam muito longe das absolutas zonas de guerra que ele viu em algumas partes do país; para começar, a terra não estava sendo arrasada por bombardeiros de B-52 e não estava sendo reduzida a cinzas por napalm. A princípio, as pessoas aqui pareciam estar vivendo suas vidas como se tudo estivesse normal e, por um momento, parecia que nenhuma guerra estava acontecendo.

Isso me faz pensar… Jai pensou consigo mesmo, os olhos examinando os aldeões e a paisagem verdejante. Por que estamos aqui?

Embora sua fiel M16 estivesse pendurada no ombro em uma posição baixa e pronta, os olhos e a cabeça de Jai estavam constantemente girando. Aqui, no entanto, ele se sentia um pouco seguro. A selva era apertada, escura e repleta de potenciais emboscadas dos vietcongues que poderiam vir literalmente de qualquer ângulo. Pelo menos agora que estavam a céu aberto—com visibilidade muito melhor—eles podiam usar todo o seu poder de fogo para enfrentar qualquer ameaça que encontrassem.

Além disso, o inimigo não ousaria usar seus próprios civis como escudos de carne contra os americanos… será que ousaria? Jai se estremeceu com o pensamento.

Ao passar por outro grupo de aldeões, ele parou de repente, sentindo inatamente um par de olhos olhando sua nuca. Jai olhou por cima do ombro e fixou os olhos em uma mulher de aparência anciã que estava de pé no arrozal, que parecia não perceber que sua jovem neta a estava cutucando para fazer alguma coisa.

Ele olhou de volta para a velha por um tempo desconfortavelmente longo, mesmo quando alguns dos outros em seu esquadrão passaram dele. Estranhamente, eles pareciam não se importar com essa anormalidade, mas Jai ficou quieto mesmo assim. Ele piscou, sem saber o que dizer ou fazer naquele momento, mas então sua mente de repente voltou para uma palestra dolorosamente longa que ele e os outros tiveram que assistir em Saigan.

Aulas de vietnamita.

"Xin chao," Ele sorriu, levantando a mão para acenar. Isso serviria.

A velha estreitou os olhos e rapidamente balbuciou algo de volta para ele em um idioma que ele não conseguia entender. Antes que Jai pudesse processar se havia sido xingado ou elogiado, ele sentiu uma mão em seu ombro. Um homem branco grande e musculoso então o fez voltar para a fila, dando-lhe mais algumas palmadinhas no ombro.

Jai olhou para o homem, vendo que o líder do esquadrão vestido com um durag verde do exército, Sargento Gibson, estava mais surpreso do que confuso ou zangado com Jai por ter saído da fila. Ele só suspirou enquanto acelerava o passo, voltando para onde estava na formação com o Sargento logo atrás.

"Desculpe, Sargento, só pensei a senhora ali estava-"

"Ei, não se preocupe, garoto," começou Gibson, calmo como sempre, enquanto caminhava ao lado de Jai. Músculos poderosos ondulavam sob sua pele encharcada de suor, da qual ele estava exibindo bastante, já que ele optou por usar uma camisa verde-oliva e um colete em vez de uma jaqueta OD normal. "Você não tá errado, amigo. Só não sabia porquê aquela bruxa velha tava fazendo aquilo também."

Gibson então se virou para um soldado vietnamita em sua formação, um homem baixo vestindo um uniforme com padrão de listras de tigre e chapéu tático combinando, que estava fumando um cigarro. "Ei, Kim, o que a velha lá atrás disse pro Jay?"

O soldado sul-vietnamita encolheu os ombros e tirou o cigarro da boca por um momento. "O dialeto é acidentado demais pra mim, sargento. Algo sobre o Perryman ser familiar para ela."

O fuzileiro à frente deles bufou. "Eu com certeza me lembraria da cara do único fuzileiro naval negro do 1º Pelotão."

"…e um que consegue atirar melhor do que seu jumento cego, Freyman." Brincou Gibson. Jai sorriu levemente por um momento, feliz por ver que seu Sargento ainda o apoiava.

"É, uh, Jai, a propósito, Sargento," Ele corrigiu Gibson.

Mas, antes que Gibson pudesse responder, alguém na frente ergueu o punho esquerdo, um sinal que Jai imediatamente reconheceu como alguém dando a ordem para parar. Então, ele fez exatamente isso, plantando o pé no chão e caindo sobre um joelho enquanto começava a inspecionar os arredores silenciosamente.

Um fuzileiro naval alto com uma insígnia de tenente no capacete caminhou em sua direção, depois mudou de direção no meio do caminho e foi até Gibson. Ele murmurou algo ininteligível para o homem enquanto apontava para a ladeia, olhou para Jai por um momento, depois voltou-se para os outros e continuou ao longo da longa fila de fuzileiros na formação.

Gibson então se levantou e foi para frente. "Primeiro esquadrão, atrás de mim! Kim, pegue notícias dos vietcongues dos velhos lá pra cima!"

Jai seguiu o homem e seu intérprete vietnamita, e logo se juntou a cerca de sete outros fuzileiros da formação, Kim e o sargento então começaram a falar com um velho de barba branca como as nuvens, com Gibson fazendo as perguntas enquanto Kim traduzia o que ele dizia para o vietnamita e o que o velho dizia de volta para o inglês. Enquanto isso acontecia, o resto do esquadrão se instalou em um semicírculo ao redor deles, de frente para a aldeia.

Jai se agachou ao lado da estrada de terra e examinou o horizonte, nem mesmo se preocupando em se virar ao ouvir passos atrás dele, já que já sabia quem era. Um garoto louro e esguio da idade dele com uma bandoleira de munição no pescoço e uma bandana vermelha correu para perto dele. Ele ficou de joelhos ao lado de Jai e colocou sua M60 contra a perna.

"Entãoooo, Perryman," ofegou Cody. Sua voz estava lenta e fluida. "Soube que tu tava falando com uma bruxa vietcongue lá trás. Tu sabes vietnamita agora ou algo assim, cara?"

"Só o suficiente para sobreviver, Parsons," explicou Jai suavemente, virando-se para o amigo. "Eles não nos deram um curso intensivo de vietnamita em Saigon sem motivo. Lembrei do que pude. Além disso, esses não são os vietcongues."

"Como você sabe, cara?" Zombou Cody, Jai gesticulou para os fazendeiros, ocupados como abelhas, depois para a criança ocasional correndo ou se escondendo atrás de uma palmeira, apontando e rindo para os fuzileiros navais próximos. A cena plácida era uma explicação melhor do que qualquer palavra que Jai poderia ter dito naquele momento.

"Ah." Foi como se uma lâmpada de clareza se acendesse na cabeça de Cody. Ele balançou a cabeça. "Entendi."

"Eu vejo isso e me pergunto. Eu não faço ideia de por que estamos aqui, irmão," murmurou Jai, sua mão esquerda estendida caindo em sua coxa e fazendo um barulho de palmas. Ele suspirou. "Não faço ideia mesmo."

"Tipo, eu tava pensando nisso também, cara…" Começou Cody. "Tipo… você já se perguntou o que estamos fazendo aqui? Tipo, como chegamos aqui, para ser mais específico?"

Jai encolheu os ombros. "Lutando contra comunas e políticos nos dizendo o que fazer, eu acho. O Panthers diz que estamos lutando por uma causa perdida por um governo racista que não se importa conosco." Ele fez uma pausa, gesticulando para si mesmo, depois para Cody. "Não só nós. Soldados também. Não importa se são negros, brancos ou outra coisa."

"É, isso mesmo. Se você me perguntasse, cara? O que acho é que…" Cody fez uma pausa enquanto tentava enfatizar o que estava tentando dizer com as duas mãos abertas. Ele fechou os olhos, imerso em pensamentos. "Talvez estejamos neste país distante, certo, cara, porque estamos lutando contra um inimigo inventado. Tipo, inventamos essa guerra e criamos a treta entre o Norte e o Sul, cara."

"Nunca pensei nisso dessa forma." Murmurou Jai, balançando a cabeça.

"Tipo… estamos nesse país que sabemos bosta nenhuma sobre, não sabemos nada sobre sua composição étnica, não sabemos o que os franceses e japas fizeram aqui antes, não sabemos nada sobre a política e estamos entrando e lutando a guerra deles, cara? Porque os políticos disseram que sim? Porque a guerra é uma alternativa melhor do que o comunismo?"

Cody bufou. Ele se encolheu dramaticamente, estreitando os olhos enquanto tentava racionalizar seus próprios pensamentos. "Você entende, cara? Você sabe que essa porcaria não bate, certo?"

Jai balançou a cabeça novamente. Cody era um pouco prolixo com suas explicações, claro, mas pelo menos ele tinha paciência para suportá-las com ele.

"É idiota. Mas, eu tenho outra ideia, cara. Saca só…" Cody levantou um dedo. "Talvez estejamos aqui… nesse país distante, explodindo túneis e chutando traseiros, porque o destino nos trouxe aqui. Tipo, não há outra explicação cara. Talvez fosse para estarmos aqui."

Jai estreitou os olhos enquanto observava um par de crianças correndo de uma cabana para outra. Parte dele queria admitir que Cody possivelmente estava certo, mas uma parte maior dele achava que ele era simplesmente idiota por pensar isso.

Ele bufou amargamente. "Cody, acho que eu era para ser o primeiro homem da minha família a se formar na faculdade, não o primeiro a ser militar. E no Vietnã. Isso não é destino, isso é azar."

"Ahhh, certo, certo." Cody concordou. "Esqueci, desculpe. Mas, é. Tipo, o que estamos fazendo, cara?"

"Agora essa é uma pergunta astuta, Soldado Parsons!"

Ambos os fuzileiros voltaram a atenção para a interjeição repentina em sua pequena conversa. Cody estremeceu audivelmente, murmurando algo em voz baixa. "Ah, meeerda. Contato, retaguarda."

Jai podia ver o sargento do pelotão, Segundo Sargento Buczek, se aproximando pela retaguarda, e ele estava vindo com força. Cada passo que ele dava era deliberado, e eles estavam mais largos do que o normal, o que significava que o homem atarracado que atualmente abria caminho pelos campos de arroz estava extra irritado.

"O que diabos está acontecendo aqui?" Disse Buczek, aproximando-se deles. "É hora de conversa, ou é hora de cuidar da porra da segurança, fuzileiros?!"

"Estamos cuidando da segurança pro Cabo Kim e Sargento Gibson enquanto eles conversam com os aldeões, Segundo Sargento!" Gritou Cody, quase como se estivessem em treinamento. "O tenente nos pediu pra fazer isso!"

Jai podia ver alguns dos aldeões olhando dos campos para ver qual era a comoção. Buczek também percebeu isso e voltou-se para nos dois Soldados. "Bem, me permitam me acalmar para não incomodar essa gente fina com seu trabalho de fazenda."

O sargento do pelotão fez uma pausa, baixando o tom enquanto proferia cada palavra seguinte, praticamente pressionando o nariz nos rostos da dupla enquanto se inclinava na direção deles. "Vocês dois nenroides precisam fechar a porra da matraca antes que tenhamos uma patrulha vietcongue no cu, porque vocês dois idiotas não conseguiam calar a boca. Qualquer um daqueles chapéus de arroz ali poderia ser um espião ou vietcongue em espera, e se eles virem qualquer relaxamento vindo de nós—QUALQUER relaxamento—eles vão atacar. Entendido?"

"Sim, Segundo Sargento." Latiu Cody.

"Bom." Buczek então levantou a voz. "Agora… onde DIABOS está o Gibson?"

Ao ouvir seu nome, Gibson se afastou de Kim e correu de volta para o trio, ficando na frente de Buczek. "Bem aqui. Segundo Sargento?"

Jai piscou ao ver Buczek colocar a mão no ombro de Gibson. O Segundo Sargento então apontou para o resto do esquadrão de Gibson, que ainda estava ocupando a formação em forma de semicírculo em torno de Kim e dos velhos.

"Gibson." Sou tom estava mais calmo do que o normal. "Você pode, por favor, me dizer o que há de errado com essa cena?"

Gibson parecia bastante confuso. "Meu esquadrão está fornecendo segurança para nosso intérprete Sar—"

"Eu posso te contar o que está errado," interrompeu Buczek. "Mas que CARALHOS você estava pensando ao deixar sua traseira desprotegida ao ponto de eu poder simplesmente chegar aqui assim? Você acha que o segundo esquadrão vai salvar seu traseiro de qualquer ataque pela retaguarda? PENSE DE NOVO! O traseiro deles não está nem coberto porque VOCÊ não está cobrindo o seu próprio traseiro//! Você está nessa merda há mais tempo do que esses novatos, Gibson, você deveria ter mais juízo! Dê um jeito nessa **MERDA!"

Jai deu uma breve olhada em sua unidade como um todo, visualizando os outros esquadrões em formações semelhantes à sua. Teoricamente, eles tinham uma visão de quase 360 graus da área, e qualquer fuzileiro naval com um olhar atento seria capaz de ver e atacar qualquer ameaça dentro de seu campo de visão, enquanto também cobria qualquer outro esquadrão. Do que o Buczek estava falando?

Gibson, evidentemente já sabendo disso, resmungou. "Vou consertar as deficiências do meu esquadrão. Segundo Sargento."

"Excelente!" Buczek sorriu… antes de se virar para Jai. "Agora, você… Soldado…"

"Perryman, Segundo Sargento!" Disse Jai.

"Soldado Perryman… me permita perguntar isso." Ele se inclinou desconfortavelmente perto do rosto de Jai. "Você gosta de mim? Você está apaixonado pelo meu belo rosto, extasiado pelo meu físico perfeito?"

Jai não tinha certeza se deveria ou não cair na gargalhada, ou torcer o nariz em confusão, ou ambos, então ele só olhou para o homem." Segundo… Sargento…?"

"Só te faço essa pergunta…" Sua voz diminuiu. "…Porque, Soldado Perryman, você só ficou parado aí, olhando para mim, fazendo absolutamente PORCARIA NENHUMA, ESSE TEMPO TODO. Qual é seu problema, fuzileiro? Quando eu dou uma tarefa ao seu colega fuzileiro uma tarefa, eu espero que essa tarefa seja FEITA. Eu espero que você a FAÇA. Eu espero ver MUDANÇA acontecer imediatamente. E espero ver um fuzileiro guardando a **PORRA DO BURACO ABERTO na traseira de sua formação. Vou precisar que você ACORDE."

Ele enfatizou seu último argumento batendo palmas duas vezes no rosto de Jai. "Capisce?"

Antes mesmo que ele tivesse a chance de responder, o mundo ao seu redor congelou.

Os olhos de Jai então começaram a se concentrar em algo nos campos de arroz, além de Buczek, e até mesmo de Kim e do resto do esquadrão.

Havia uma mulher de cabelo preto curto em pé nos arrozais, suas panturrilhas submersas na água. Ela usava o "pijama preto" inconfundível dos vietcongues, um equipamento de peito cáqui Chicom e um lenço xadrez em volta do pescoço; os sinais reveladores de um guerrilheiro vietcongue. A SMG francesa pendurada no ombro, no entanto, era uma anormalidade: se ela estivesse aqui para matá-lo, ela já teria aberto fogo.

Jai só olhou para ela, inclinando a cabeça para o lado, como um pássaro em confusão. Ele examinou essa mulher vietnamita cuidadosamente, sem saber se atirava nela primeiro ou continuava olhando. Pensando bem… ela nem parecia vietnamita, muito menos americana. Sim, ela tinha a pele bronzeada, mas suas características gerais e proporções, como o rosto e os olhos, eram muito diferentes das de uma mulher vietnamita típica.

Calma, os olhos dela.

Grande parte de seu rosto estava escondido por seu cabelo por meio de uma brisa aparentemente inexistente ao seu redor, embora o mundo estivesse congelado. Seus olhos, no entanto, ainda pareciam estar travados nos dele, apesar do bloqueio, e era um olhar antinatural, surreal e sedutor do qual Jai simplesmente não conseguia escapar. Ele não conseguia entender onde a tinha visto, mas ela parecia familiar.

De alguma forma.

Mas que diabos? Jai fez as palavras com a boca, se vendo incapaz de pronunciá-las.

Ele viu a mulher levantar a mão esquerda para o estômago, a mão em concha, enquanto a mão direita espelhava o movimento, embora estivesse invertido. Os dedos de ambas as mãos dela se tocaram, e então Jai teve um momento de clareza ao perceber o que estava acontecendo.

A voz de Buczek ecoou em seu ouvido enquanto o mundo ao seu redor se derretia em um céu negro e estrelado.

"ACORDE."

***

stars.png

Rodésia, 1973


Jai levantou-se lentamente do saco de dormir e sentou-se. Um raio de luar iluminava seu rosto enquanto ele saía do mato sob uma acácia. À sua esquerda havia um saco de dormir. À sua esquerda havia um saco de dormir vazio e seu Land Rover estacionado, e à sua direita, Darren dormia profundamente, ocasionalmente rolando em seu saco de dormir.

O conteúdo do sonho que teve foi, para dizer o mínimo, vívido, mas Jai já estava esquecendo os detalhes enquanto ele ficava parado ali. Ele rapidamente enfiou a mão em sua cinta ALICE e tirou um pequeno caderno e uma caneta, acendeu a lanterna de lâmpada vermelha angulada presa à sua cinta e começou a recitar o que conseguia se lembrar.

"Pelotão a caminho da vila, vi uma velha estranha olhando para mim," Ele sussurrava para si mesmo enquanto escrevia. "Gibson me ajudou… Cody reclamando de guerra, longo como sempre. Buczek berrando comigo sobre alguma bobagem sobre não prestar ate—"

Calma, não. Isso não tá certo.

Dai, a mulher. Jai não tinha se esquecido dela. Ele escreveu o encontro com ela em seu caderno também. Falando dela…

Preciso ir falar com ela.

Ele guardou o caderno e a caneta no bolso e se levantou, e então se esgueirou para fora do acampamento.

Ele a encontrou sentada em cima de uma pedra próxima, de costas para Jai enquanto estava sentada em silêncio, olhando fixamente para a Via-Láctea estampada no céu noturno. A tênue luz branca da lua acima dava ao cabelo preto da enigmática mulher um brilho prateado, e também produzia um brilho branco no fuzil de assalto sul-africano recém-limpo pendurado no ombro dela. Uma brisa passava lentamente pela área, farfalhando os arbustos ao redor da pedra em que ela estava sentada.

Se não fosse pelo fato de Jai estar lá para questioná-la, ele teria comentado o óbvio e dito que ela estava bonita. Ele se manteve firme e olhou para ela. "Ei."

Mira virou a cabeça por cima do ombro, seus olhos negros examinando-o de cima a baixo. "O Hudson tem razão. Você é furtivo, Jay. Nem te ouvi." Ela então girou seu corpo para ficar de frente para ele. "Bela lanterna. Por que a luz está vermelha?"

"É uma lâmpada de luz vermelha. A luz vermelha é mais difícil para o inimigo ver à distância, mas ainda consigo fazer o que tenho que fazer com ela." Ele gesticulou para a lanterna inclinada presa à sua cinta. "Tenho ela aqui para que eu possa usar as duas mãos se precisar usar um mapa."

"Ham." Bufou Mira. "Quanto mais se sabe. Acho que aprendi algo novo com você hoje, Jay."

"A GOC ainda está por aqui?"

"Nope. Jackrabbit e Roadrunner se foram antes de montarmos o acampamento, fizeram uma extração chique usando um Sistema de Recuperação Fulton se você viu. Você já viu um desses em ação?"

Jai sacudiu a cabeça.

"Mmm. É legal. De qualquer forma, por que você está acordado? Você não deveria estar em guarda a esta hora de qualquer maneira." Ele viu que ela estava verificando algo em seu rifle, mas não estava mantendo contato visual com ele.

Talvez ela soubesse o que ele estava planejando.

"Estou acordado porque tive um sonho estranho," mentiu ele. Era uma boa mentira, naturalmente, já que era parcialmente verdade. "Precisava dar uma volta por aí."

Mira balançou a cabeça. "Faz sentido."

Jai então se aproximou da pedra, finalmente fazendo contato visual com Mira enquanto olhava para ela. "É, faz sentido, mas o sonho que tive não. Eu estava no Vietnã, conversando com minha antiga unidade. Meu sargento de pelotão, Buczek, estava reclamando comigo sobre cuidar da segurança e não prestar atenção. Meu amigo Cody Parson estava divagando sobre porque a guerra é uma droga. Você estava lá."

Mira ergueu uma sobrancelha, e então encolheu os ombros. "Não sei o que te dizer, Jay. Sonhos estão geralmente relacionados a eventos passados, ou são simplesmente uma recriação deles e eventos recentes da vida, então isso provavelmente explica por que eu apareci. Diabos, talvez até o Darren possa ter aparecido nele, também. Isso é só minha experiência, mas parece que você ainda tem lembranças de seu tempo na selva nessa sua cabeça."

Jai franziu a testa. "O problema é que não foi assim que esse evento na minha memória aconteceu." Ele sacudiu a cabeça. "Ele foi muito mais quieto na vida real, muito mais sério. Menos conversa, mais ação." Ele fez uma pausa. "Mais morte."

Então, ele estendeu um dedo para Mira, que ele só agora percebeu que estava mexendo com uma luva sem dedos sobre a mão direita, como se ela não estivesse prestando atenção no que ele estava dizendo. "Mas a questão não é essa. Você estava lá. Só parada lá. Por que você estava no meu sonho?"

Ela riu, meio bufando em descrença, e gesticulou para si mesma. "Se eu estava no seu sonho, certo, eu estava fazendo algo estranho nele? Além de ficar parada. Digo, vamos lá. Seja honesto." Ela sorriu. "Eu não julgo."

Isso não estava chegando a lugar nenhum. Jai deixou cair a mão ao seu lado, bufou ruidosamente de frustração, e então recriou o gesto com a mão que Mira havia feito no sonho.

Seus olhos se arregalaram de surpresa. "Eu—"

Antes que ela pudesse terminar, a pistola .45 de Jai já estava fora de seu coldre e ele a estendia para ela sem qualquer hesitação. Ela congelou enquanto o controle da conversa era transferido imediatamente para ele, agora visualizando o mesmo brilho ardente nos olhos do homem negro que ele tinha quando derrotou o monstro mais cedo naquele dia.

"Jai—"

"Eu não vou perguntar isso de novo." Jai colocou o polegar no cão da pistola. "Por que você estava no meu sonho?"

Um silêncio se seguiu pelo que pareceu uma eternidade, antes de Mira descer da pedra e encarar Jai, colocando sua arma no chão. Ela ergueu as mãos, como se quisesse mostrar que estava desarmada, mas Jai viu sua mão esquerda sem luva assumir outro gesto estranho.

Seu punho estava fechado, mas então seus dedos indicador e médio se estenderam, seu polegar se conectando ao dedo indicador. Jai inclinou a cabeça para o lado. "O que você tá fazendo?"

Ela sussurrou algo e estalou os dedos naquela mão, e então Jai a viu espontaneamente explodir em chamas.

Ele desesperadamente recuou, quase atirando e Mira em antecipação de que ela estava prestes a incendiá-lo. Sua mão queimava como se tivera sido mergulhada em óleo e incendiada, mas, estranhamente, a mulher não fez nenhum comentário sobre isso.

Jai se encolheu novamente. "Que porr-"

"Estou tentando te mostrar," Começou Mira calmamente. "Você já ouviu falar do termo 'taumaturgia' antes, Jay?"

Jai baixou a pistola, como se entendesse onde ela queria chegar com isso. Ele a colocou de volta no coldre e relaxou. "Eu ouvi o termo ser usado pelo Hudson algumas vezes de passagem e formulei uma conclusão básica do pouco que eu sabia. Magia."

"Então, você sabe o que é um taumaturgo, certo?"

Ele balançou a cabeça. Encaixar as peças tornaram isso óbvio. "Um mago. Um bruxo." Jai então olhou para a estranha e flamejante mão que Mira tinha erguido. "Uma bruxa."

Ela estalou os dedos e, em um instante, a chama desapareceu, sua mão completamente livre de queimaduras ou outras marcas. "É isso que sou. Uma taumaturga. Mais especificamente, uma taumaturga de combate. Hudson precisava de um pros Escoteiros, então foi aí que entrei. Aquilo foi apenas um encantamento flamejante básico."

"Entendo. Mas por que todo esse segredo?" Jai cruzou os braços. "Por que você tem sido tão misterioso pro Darren, pra mim? Digo, eu não pergunto muito, e eu não digo muito…"

Ele gesticulou para ela. "Mas eu literalmente não faço ideia de quem você é, e de onde você veio. Tipo, a camuflagem de "caçadora de patos" que você usa. O rifle sul-africano. A mão literalmente pegando fogo. Você brotando nos meus sonhos. Não tenho respostas, Mira."

Ela suspirou. "Segredo é um luxo que poucos podem se dar hoje em dia."

"Estou ciente disso. Aprendi isso na minha entrevista com o Hudson. Eu só quero algumas respostas, Mira." Ele então se deteve. "Suponho que Mira também não seja seu nome de verdade. Ele é um pseudônimo."

"É." Disse ela, sem a menor cerimônia.

Jai revirou os olhos. "Eu sabia."

"Quanto àquele sonho…" A voz de Mira começou a diminuir. "Fiquei curiosa para saber quem você era. Me desculpe. Você é um enigma, Jai, você sabe disso, certo? Alguém que ainda é relativamente 'normal' apesar de estar em tudo isso… mas alguém que ainda tem espaço para crescer entre o anômalo. Você também é um bom aprendiz. Aposto que atualmente você é o mais bem equipado de todos nós para se adaptar a este novo mundo."

Ele ergueu uma sobrancelha com o comentário dela. Quanto que ela sabia sobre ele, e por quanto tempo será ela poderia estar se escondendo em seus sonhos? Será que Darren também era um taumaturgo? O Hudson? Além disso, qual era o nome verdadeiro dela? Muitas perguntas estavam se apresentando a ele, mas ele sentia como se tivesse muito pouco tempo para que todas fossem respondidas.

"Jai, a razão pela qual sou tão reservada com meu passado, é porque não posso confiar na própria organização pela qual luto." Mira desviou o olhar, seus olhos mais uma vez nos céus estrelados. "Até certo ponto, você também não deveria."

Jai parou para pensar em suas palavras e deu um passo à frente. "O que você quer dizer com isso?"

"Você já parou e pensou sobre por que tipo de causa você está lutando, Jay?" Ela se virou para ele. "Por quem você luta, e por quê? Você quer ir em frente e responde a essa pergunta aqui, agora?"

Em resposta, Jai ficou em silêncio por alguns segundos para pensar. Realmente, ele estava sem palavras aqui—pelo que ele estava lutando? Dinheiro? Fama? Será que era porque ele achava que esta era a coisa certa, porque pessoas como sua mãe e seu pelotão não mereciam morrer para forças totalmente desconhecidas a eles? Será que era porque a humanidade precisava de proteção contra as anomalias, e ninguém mais estava disposto a lutar por essa causa?

Ou será que era algo mais? Talvez Jai não tivesse escolha—ele simplesmente escolheu se juntar à Insurgência porque Hudson lhe dera uma oportunidade em um ponto baixo de sua vida, e ele a aproveitou sem pensar duas vezes. Talvez sua ideologia de combater o anômalo usando o anômalo fosse algo atraente para ele. Talvez fosse a emoção de invadir acampamentos da Grande Zimbábue e transformar artefatos antigos e poderosos em armas. Talvez algo muito maior do que ele o obrigou a pegar aquele cartão de visita e ligar para aquele número naquele fatídico dia em Atlanta, três anos atrás.

Talvez ele estivesse totalmente errado, e fosse algo diferente, mas ele ainda não tinha descoberto.

"Eu lito… porque não tenho outra opção," os pensamentos de Jai começaram a se transformar em palavras enquanto ele olhava para o chão. "Não quero voltar para casa para um país que me deu as costas, e eu quero vingar meu pelotão. Eu não quero que mais ninguém tenha que passar pelo que passei no Vietnã. Jamais. Eu luto porque é o que o Hudson me diz para fazer, e sou pago por isso, e luto para impedir que a Grande Zimbábue varra este país e seu povo do mapa…"

Mira ergueu um dedo enquanto se apoiava na pedra, observando-o andar pela clareira pensativamente. "É, você acha isso—e esses são bons argumentos—mas você tem alguma ideia de como é a situação na Rodésia? Alguma ideia do que são os Escoteiros de Hudson? O que é a Insurgência?" Ela inclinou a cabeça para o lado. "Você nem sequer sabe o que é a Insurgência do Caos, Jai?"

Para ser sincero… ele não sabia de nada disso. Ele só sacudiu a cabeça. "Não."

"Quer você aceite ou não," começou ela, "A Rodésia está dividida entre pretos e brancos. Este lugar é muito melhor do que a África do Sul e seu apartheid, mas ainda não é perfeito. Enquanto lutamos contra os insurgentes comunistas, o governo branco minoritário está se esforçando ao máximo para se manter no comando, e eles são implacáveis quando se trata disso."

"E a Grande Zimbábue é um desafio a esse status quo. Eles aparecendo significa que eles estão correndo para removê-los, antes que eles acabem com os rodesianos, ou pior," concluiu Jai, enquanto Mira levantava um polegar para cima em confirmação. "Parando para pensar sobre isso… tudo siso parece estranho que eles estejam lutando contra a Grande Zimbábue para começo de conversa. Eles estão aqui há mais tempo… Mas e a Insurgência?"

"Eu não tenho certeza se você sabe disso, mas nós somos apenas uma fração de um grupo maior, mais organizado e mais enigmático, Jai. Você já percebeu isso?" Ela levantou a mão para as estrelas, como se estivesse contando cada ponto brilhante no vazio. "Há uma infinidade de outros "Escoteiros de Hudson" por aí para uma infinidade de outros países. Somos um exército secreto inteiro que age por instinto e princípio. Nossa luta não é estritamente aqui. Ela é global. Não é só contra a Fundação, que tranca essas anomalias e esconde seu verdadeiro potencial do mundo, ou mesmo contra a GOC, que está empenhada em destruir todas elas. É contra as forças incompreensíveis para nós, o próprio anômalo."

"Então somos uma organização global…" Jai pensou em voz alta, mas parou novamente quando sentiu sua mente girar com as informações que ele estava recebendo. Como ela estava descrevendo a Insurgência agora os fazia parecer mais alinhados com a GOC, ou talvez até mesmo a Fundação, até certo ponto. As coisas não estavam fazendo sentido, mas, novamente, quando elas realmente precisam fazer?

"Mas de quem diabos recebemos ordens?" Jai ergueu uma sobrancelha. "Se não do Hudson, então de quem?"

Ela suspirou novamente, esfregando as têmporas. "Jai, você está pensando nisso como se fosse o exército, não uma bagunça desorganizada de soldados e cientistas seguindo uma hierarquia frouxa, competindo pelo poder uns sobre os outros. Nós recebemos ordens do Hudson. O Hudson recebe ordens do Comando—do Comando Delta."

Jai balançou a cabeça, tendo ouvido o termo mencionado antes também. "E o Comando Delta recebe ordens do…"

"Do Engenheiro." O tom de Mira era ameaçador. "Algum telepata, ou um premonitor, ou algo entre os dois, eu não sei. O que eu sei é que o Engenheiro escreve as Medidas do Plano—nosso objetivo abrangente de agora até sua conclusão—e as entregas ao Comando Delta. O Comando Delta então compila essas Medidas e as entregas a pessoas como o Hudson como uma Compilação de Medidas e, a partir daí, o Hudson nos dá nossas missões. Aquele monstro que você explodiu a e missão em torno dele? Aquilo foi literalmente parte de um Plano."

Ela parou. "Toda vez que uma Compilação de Medidas é fornecida, ela quase sempre é executada sem falhas. Não sei como."

O rosto de Jai ainda permanecia neutro enquanto ele pensava em algo de seu sonho, algo que Cody havia mencionado antes, talvez, mas as palavras já estavam sumindo. "Suponho que esses Planos sejam tão escassos quanto eles vêm."

Mira apontou uma arma de dedo para ele, que o fez se encolher, por um bom motivo. "Bingo. Você está entendendo, Jay, e está muito mais falante. Você ficaria surpreso com o tempo que já tive que esperar às vezes para que uma nova Compilação de Medidas viesse."

Jai balançou a cabeça. "Mas, sobre o Engenheiro…" Ele ergueu uma sobrancelha. "Certamente não se pode ter um Engenheiro sem uma Máquina, não?"

Ele viu Mira olhar para o chão por um momento enquanto ele dizia isso, como se ele tivesse dito algum tipo de tabu que ele não tinha permissão para falar. Ela permaneceu desconfortavelmente quieta por algum tempo, antes de começar a murmurar: "…Você tá certo. O problema é, Jai, que ninguém sabe quem é o Engenheiro, ou o que é a Máquina. Pelo que sei, as ordens do Engenheiro são esporádicas, desorganizadas, e o Comando Delta tem que vasculhar todas elas."

"Mmm." Disse Jai, refletindo sobre algo que ela havia dito antes. "Você disse que eu não devia confiar na Insurgência. É esse o motivo?"

"É." Começou ela, pegando seu rifle novamente. "Essa parada toda é construída na base do subterfúgio, do engano. Um braço dessa coisa de muitos braços que chamamos de Insurgência do Caos funciona independente do outro, sem saber o que o outro braço está fazendo."

Ela cruzou os braços. "Creio eu que você nunca tenha nem conhecido o Comando Delta, provavelmente nem ouvido a voz deles. Ninguém já ouviu, nem mesmo o Hudson, provavelmente. Ninguém sabe quem eles são—o que eles são—e por que eles fazem o que fazem…"

A voz de Mira diminuiu por um momento. "…e ninguém sabe como o Engenheiro recebe suas ordens. Ninguém sabe a natureza desses Planos, e como eles parecem ser executados tão perfeitamente. Ninguém sabe o que é a Máquina. Ninguém sabe onde está a Máquina. Ninguém nem sabe se temos uma Máquina. Ninguém sabe por que lutamos, e por que fazemos as coisas que fazemos, nem por que lutamos entre nós mesmos com tanta frequência. Ninguém sabe por que odiamos a Fundação, além de que eles são 'reprovados imorais' que 'mantêm o mundo às cegas,' como o Comando uma vez disse. Ninguém sabe sobre a guerra que travamos contra o anômalo, e por que a lutamos. Ninguém sabe de nada."

"Exceto por seguir ordens," Acrescentou Jai sombriamente quando Mira terminou seu discurso. "Isso é tudo o que sabemos, eu acho. Estamos todos sendo mantidos sem saber sobre o verdadeiro propósito da Insurgência, e apenas seguimos nossas ordens. Meio irônico."

O que era a Insurgência, então? Hudson a descreveu como um grupo virtuoso de combatentes da liberdade, que procuravam mostrar ao mundo uma nova maneira de pensar e incentivá-lo a abraçar o desconhecido, ao mesmo tempo, em que protegiam a humanidade das forças inaturais que surgiam durante a noite. Pelos últimos três anos, Jai achou que essa interpretação era a correta.

A visão da Mira contradizia isso; ela via a Insurgência como uma bagunça desorganizada e caótica de mercenários, pesquisadores e comandantes, todos seguindo as vagas ordens de um círculo interno obscuro sobre o qual eles nada sabiam. Quanto mais ele pensava sobre isso, mas parecia que a ideia dela era verdadeira. Jai comparou isso a um jogo de telefone, onde pequenos equívocos e inconsistências podem mudar o quadro geral. A Insurgência realmente, como seu nome, era Caos absoluto.

Ele percebeu que tinha que fazer suas próprias suposições daqui para frente. Se Mira era realmente confiável, então ninguém era confiável. Nem mesmo ela.

Ele voltou-se para o acampamento. "Acho que eu deveria ir embora. Mas eu só tenho que perguntar: como você sabe tanto sobre a Insurgência? Há quanto tempo você está nisso, para saber tudo isso?"

Ela sabia muito sobre a Insurgência, talvez um pouco demais para o gosto dele, mas Jai imaginou que seria bom ter amigos conhecedores em uma organização como essa.

Ela nunca respondeu, no entanto, e ela sabia por quê. O vento parando também chamou sua atenção.

Era como se o mundo inteiro de repente tivesse parado de se mover para a dupla. Os sapos e insetos pararam de fazer barulho quando isso aconteceu, como se soubessem que algo estava acontecendo também. Temendo que o pior estivesse prestes a acontecer, Jai imediatamente desligou sua lanterna vermelha e fez sinal para Mira ficar o mais baixa possível, e então começou a rastejar de volta para o acampamento.

Seus olhos percorreram a clareira escura, procurando por quem ou o que quer que estivesse os perseguindo na escuridão. As árvores pareciam estar se aproximando deles a cada passo que ele dava, estendendo-se cada vez mais para o céu estrelado como a caixa torácica de um animal morto.

Estava calmo, quase calmo demais, e enquanto Jai examinava a escuridão, de repente ele olhou para o lado para Mira, que estava a apenas alguns passos de distância e mal iluminada pelo luar. Ele viu que a mulher tinha um olhar intenso e concentrado em algo na escuridão que ele não conseguia encontrar. Este era um olhar que ele conhecia muito bem observando pessoas como o Sargento Gibson e Segundo Sargento Buczek em combate; ela sabia para o que estava olhando e pretendia matar.

Sabendo o quão rígida era sua linguagem corporal, ele não ficaria surpreso se ela fosse em frente e começasse a atirar ali mesmo, mas sua estatura e respiração superficial estavam emitindo outra emoção para Jai.

Hesitação.

Assim que ela ficou tensa, levantando seu rifle de uma posição baixa e pronta… um thwoonk oco de repente soou de algum lugar na floresta. Jai caiu no chão e cobriu a cabeça, imediatamente reconhecendo o som da M203 disparando, e os olhos de Mira se ergueram.

À terra, mal iluminada pelo luar, de repente ficou tão clara como se fosse dia, quando uma esfera branca de luz materializou acima da clareira. O clarão redondo iluminou a forma de um homem africano alto e musculoso coberto de tinta branca de guerra, e fez as figuras escuras de homens armados em equipamentos de combate pesados escondidos na folhagem ao redor deles se destacarem como um polegar inchado.

Logo antes que ele pudesse começar a gritar para Darren sair de lá, ele ouviu o estalo de uma grande arma disparando à sua frente. A força da explosão diante dele o fez sair voando pelo que pareceu uma eternidade, antes de suas costas finalmente encontrarem o chão duro.

As vocalizações desesperadas da Mira e os gritos do Darren foram abafados pelo estalo avassalador de tiros e chiados de explosões mágicas sendo disparadas contra eles de todos os lados. Quando ele começou a ficar inconsciente, Jai viu as estrelas acima lentamente começarem a desaparecer; elas foram substituídas por uma escuridão profunda e expansiva que lentamente o abraçou.

Logo, tudo o que ele podia ver era a escuridão, e tudo o que podia ouvir era o silêncio.

Salvo indicação em contrário, o conteúdo desta página é licenciado sob Creative Commons Attribution-ShareAlike 3.0 License