Pukae

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Flynn Watson começou seu dia com uma xícara de café. Isso foi 14 horas atrás.


DE: MJones4@SCiPnet
Para: EHolman@SCiPnet
CC: RAISA do Sítio-64
ASSUNTO: Crocodilo

Os servidores de dados do Sítio-64 estão atualmente sofrendo um Ataque de Crocodilo. Esteja ciente que o banco de dados local foi desconectado da rede do Comando Supervisor até novo aviso, tome extremo cuidado ao acessar dados eletrônicos. Lamentamos pela inconveniência.

— Maria Jones, Diretora, RAISA


Os escritórios da RAISA do Sítio-64 eram pouco mais do que armários de armazenamento onde alguém enfiou uma mesa, uma estação de trabalho e alguns armários de arquivos. A maior parte do escritório era dedicada aos Arquivos, tanto os arquivos físicos como os servidores que, na maioria dos dias, tornavam o primeiro obsoleto. O escritório estava lotado, isolado e cheio de ventiladores.

Em suma, era fácil esconder o ato de colocar adderall no café de alguém.

Isso não deixava as coisas mais saudáveis. Isso certamente não reprimia a agitação no poço do estômago de Flynn enquanto ele vasculhava fichário atrás de fichário, procurando isso ou aquilo para que alguém ou algo pudesse estar onde ou quando era necessário. Mas o adderall mantinha Flynn alerta, e seu supervisor garantia a ele de que isso mantinha outros vivos.

Assim que o Crocodilo fosse morto, ele tiraria a semana de folga.

***

Rogers e Shah estavam de pé nas proximidades do bebedouro quando Flynn entrou no seu próximo intervalo. Felizmente, eles não fizeram muito mais do que acenar para Flynn antes de voltar a conversar.

"Então, qual que é a diferença?" Shah deu um passo para trás para deixar Flynn encher seu copo de papel. "Obviamente, não é literalmente um crocodilo."

"É vago, certamente." Nada como um copo refrescante de água gelada para fazer Flynn se sentir um pouco mais vivo. Mas ele não aliviaria as dores da fome. "Em geral, um Crocodilo de Água Doce é o que imaginamos quando pensamos em um Crocodilo. shortnin_bread foi um Crocodilo de Água Doce."

Flynn abriu a geladeira comunal, procurando o que restava de seu almoço embalado. Se a decisão anterior de racioná-lo foi boa ou não, as enchiladas do dia anterior pareciam boas agora.

Shah cantarolou. "Mas por que dizemos que ele é de água doce, então?"

"Bem, eu diria que seja um contraste com o Crocodilo de Água Salgada."

Ah, ai estava. Flynn cuidadosamente tirou seu almoço para fora da geladeira, despejando-o em um prato de papel e colocando-o no micro-ondas por um minuto.

Enquanto isso, Rogers continuou: "Honestamente, suspeito que seja um simples jogo de palavras. O crocodilo de água salgada apresenta desafios adicionais por causa de sua tendência a embaralhar os dados pelos quais nada. 'Salgado' e tudo mais. A água pode… ela pode ser uma referência ao dano eletrônico?"

"Tem que ter um jeito melhor de falar sobre tudo isso, você não acha?"

"No mínimo, um Crocodilo é memorável e terrível. Abstrato. Eles poderiam ter chamado isso de Terra Arrasada e o pessoal mais novo provavelmente o trataria como um worm."

Ding

Flynn suspirou, pegando a enchilada do micro-ondas. Uma breve guerra durou em sua cabeça entre nojo e desespero, terminando em um cessar-fogo e na… venda de armamentos de plástico. Ou algo. As metáforas pararam de funcionar depois de 12 horas seguidas de trabalho arquivando. Será que isso sequer era uma metáfora?

A enchilada estava ok.


DE: EHolman@SCiPnet
Para: MKlotter@SCiPNet
CC: RAISA do Sítio-64
ASSUNTO: Problema do Crocodilo

Desculpe, mas precisamos que você e sua equipe fiquem um pouco mais do que pensávamos. As RAISAs do Sítio-98 e -04 não poderão cuidar da carga do turno da noite devido à desconexão. A cozinha estará fornecendo café grátis e, se isso durar mais de 36 horas, veremos se conseguimos fazer um acordo com a Oneiroi.

Peço desculpas pela inconveniência.


O café era inútil; era o barulho periódico do metal e da fiação que servia para manter Flynn acordado.

Flynn estava passando pela sala do servidor na última vez em que as "mandíbulas" do Crocodilo fecharam. Não dava para perder; quando mais você vivencia a explosão repentina e violenta de uma torre de servidores? Talvez em uma ala diferente do departamento de TI. Uma em que o risco de tropeçar e derramar uma pilha de relatórios de incidente cuidadosamente arquivados era um problema menor.

Esse era o fim das surpresas, infelizmente. O que acontecia depois era completamente previsível.

A técnica Song, que trabalhava em um escritório adjacente, praguejaria, saindo de seu cubículo com seu pacote de sais sagrados. Alguns dos solucionadores de problemas entrariam na sala para documentar o hardware afetado enquanto Song salgava os restos e recitava de má vontade uma oração a Nosredna, o deus doméstico da solução de problemas e da segurança cibernética. Um ticket seria enviado para o hardware, anotando as portas conhecidas empregadas pelo servidor em questão. A partir daí, quarentena em todos os lugares para onde o Crocodilo poderia ter nadado.

Ninguém com n minúsculo ajudou Flynn com seus relatórios derrubados.

***

FWatson: to cansado
PShah3: Acho que estamos todos cansados.
HGoldman2: Posso falar sobre o tempo
HGoldman2: sabe, com o
HGoldman2: lagarto
FMonk: Eu trabalhei pra caramba para configurar isso. Fique tranquilo, os tablets estão isolados do banco de dados do 64. Tijolos com cabos.
FMonk: Nenhum Crocodilo.
PShah3: Ainda não sei por que eles chamam isso de "crocodilo".
MNishida: *Crocodilo
HGoldman2: Isso importa?
MNishida: Pergunte à Gulf Constellation
PShah3: Trabalhei brevemente com a Gulf. Não tenho certeza por que isso importa.
MNishida: Qual estado
PShah3: Houston
HGoldman2: Houston é uma cidade, na verdade
MNishida: Para ser justo, a Grande Houston deveria ser um estado
FWatson: algum progresso no crocodilo
MNishida: *Crocodilo
FWatson: sao minhas horas extras e vou gramaticar mal se eu quiser
PShah3: São nossas horas extras.
HGoldman2: Camarada Priya
FWatson: mano
FWatson: preciso voltar aos relatorios. ate

***

Secretária Lee devolveu o arquivo. "Sua solicitação de impressão foi negada, Sr. Watson."

Flynn franziu a testa. "O quê? Como assim?"

"SCP-2906 é um risco cognitivo de classe Keter, Sr. Watson." Lee ajustou seus óculos. "É contra a regulamentação a RAISA reproduzir riscos cognitivos de dificuldades de contenção Euclídeo ou superior. Ao fazer cópias deste documento, eu estaria reproduzindo as imagens anexadas, introduzindo outra instância de SCP-2906 ao sítio."

"Bem, você não pode só copiar todo o resto?"

"Infelizmente não, Sr. Watson. Exigimos a aprovação do projeto de 2906 para reproduzir partes individuais de seu arquivo."

"Isto é para o pesquisador Gonzales. Ele está se juntando ao projeto."

Lee balançou a cabeça, voltando-se para o monitor e digitando algo. Difícil dizer o quê, com o filtro de privacidade. Ela balançou a cabeça para si mesma, antes de se voltar para Flynn. "Atualmente, o Sr. Gonzales não faz parte do projeto."

"Mas ele vai se juntar ao projeto. Ele só precisa do arquivo."

"Mas ele não faz parte do projeto."

Flynn gemeu. "Você não recebeu o memorando da pesquisadora Labelle? Você estava no CC."

"Eu recebi, sim. No entanto, em nenhum momento a Sra. Labelle autorizou a reprodução parcial do arquivo de SCP-2906. Como tal, não posso reproduzir os materiais solicitados." Lee fez uma pausa longa o suficiente para Flynn quase ser interrompido por ela. "Além disso, não posso fazer um pedido à Sra. Labelle neste momento, visto que ela atualmente reside no Sítio-19."

"Mas o projeto do 2906 não tem base no Sítio-64?"

"Isso ele tem, Sr. Watson."

Não havia adderall suficiente no mundo para lidar com isso agora. "Certo, tudo bem. Pergunta: como auditor da RAISA, posso compartilhar informações de que tenho conhecimento com pessoas habilitadas para elas, correto?"

Lee balançou a cabeça. "Isso você pode, Sr. Watson."

"E posso solicitar uma cópia física de documentação para a qual tenho autorização, correto?"

"Não vejo por que não, Sr. Watson."

Flynn suspirou. "Então, minha posição me dá autorização para a documentação de SCP-2906?"

"Um momento, Sr. Watson." Lee voltou-se para o monitor, tomando cuidado para não acionar o Crocodilo enquanto ela vasculhava os arquivos. "Tudo bem, parece que você tem autorização de RAISA para o arquivo de SCP-2906."

Ah, graças a deus. "Posso ter uma impressão dele, então?"

"Você não pode."

Droga. "Por quê?"

"Novamente, não podemos reproduzir riscos cognitivos de tais dificuldades de contenção."

"Droga— desculpas, eu…" Flynn fechou os olhos e contou até dez. "Você pode… imprimir o arquivo com uma autorização menor? Uma sem a imagem?"

"Infelizmente, Sr. Watson, você não tem autorização para nenhum outro nível de segurança em relação à documentação de SCP-2906." Balançando a cabeça, Lee fechou a aba e se voltou para Flynn mais uma vez. "Isso será tudo por agora?"

"… isso deve ser tudo por enquanto, sim."


DE: MKlotter@SCiPnet
CC: RAISA do Sítio-64
ASSUNTO: Crocodilo

Informamos que a máquina de café quebrou. A manutenção começará às 9 da manhã.

— Magnus Klotter, Diretor, RAISA do Sítio-64


Flynn se consolava sabendo que seus colegas de trabalho estavam tão viciados quanto ele. Era um consolo barato.

"São todos os números seis." Harold Goldman, de quem Flynn se orgulhava de lembrar o primeiro nome, tinha sido designado para verificar a integridade organizacional da documentação física. Ele não havia sido designado para documentar teorias de conspiração numerológicas (o Departamento de Numerologia estava com o prato cheio cobrindo isso), mas eles estavam se aproximando da marca de 24 horas e às vezes você tem que se virar com o que tem. "2106, 2306, 2906, e então você tem os sessentas. Eles todos, eles todos estão aqui, Flynn. No Sítio-64."

"Sabe, eu nunca notei." No mínimo, isso o mantinha ocupado.

"Bem, é isso que estou dizendo, Flynn! As pessoas estão só, só deixando isso acontecer. Veja, é por isso que a teoria do cisne funciona, né? Geração de números aleatórios não simplesmente faz isso, a menos que seja controlada pelos deuses."

Certo, e o que esse arquivo estava fazendo ali? "Acho que não acredito em Deus."

"Digo, poderia ser esse. Sempre sinto que a divindade criadora tem um mau senso de humor, sabe?" Um som de aparafusamento veio da direção-geral de Harold. "Pessoalmente, eu prefiro a teoria do cisne ou, sabe, aquele estranho sincretismo do budismo e do maxwellismo que nós… na verdade, você tem autorização pro 1A06?"

"Eu teria que verificar com uma secretária."

"Droga." Harold fez uma pausa. "Se a teoria do cisne for verdadeira, espero que o meu deus seja o do 348. Seria uma droga se eu tivesse algum cínico que achasse garagens do mal ou um universo inteiro sem morte engraçado."

Flynn concordou por instinto. "Claro, isso seria bacana."

Em outro lugar do escritório, uma torre de servidores implodiu.

***

Descrição: SCP-1A1A é uma Entidade Onírica NFPDI1 ligada a uma máquina de café da marca Zojirushi. Indivíduos em um raio de 500 metros que não experimentam um ciclo de sono faz 24 horas são capazes de perceber o objeto e consistentemente o descrevem como-

Uma galinha de borracha de 2 metros de altura, com olhos sem alma e braços como os de Popeye, de repente e rudemente se manifestou diante de Flynn. Ninguém mais pareceu perceber isso.

"NÃO ACHE QUE OS HATERS NÃO TE VEEM, FLYNNBO WALES" A galinha tinha uma voz exatamente como Flynn teria imaginado. "OS HATERS VÃO TE VER! SEUS OLHOS ACORDADOS LANÇAM UM OLHAR SOBRE A ESCURIDÃO, CHEIA DE HATERS}}"

Flynn suspirou, beliscando a ponta e andando ao redor da galinha. Ele tinha documentos que precisavam ser entregues.

Se o buzinar constante de uma buzina de palhaço era alguma indicação, Flynn estava sendo seguido. "VOCÊ TENTA ESCAPAR DE SEUS DEVERES, FLYNNBO, MAS OS HATERS VÃO TE VER" Se a galinha não estava gritando alto o suficiente para ouvir do outro lado do sítio, isso deve ter confirmado a situação. "VOCÊ SABE O QUE TEM QUE FAZER, FLYNNBO WALES"

Segundo a Fundação, Flynn tinha que ignorar a galinha. Provavelmente não era isso que eles queriam dizer.

Os sapatos de palhaço seguiam Flynn enquanto ele se dirigia à recepção. Nem o secretário Estevez, nem o técnico Mallard pareceram perceber.

Flynn tentou não se contorcer. "Certo, então, aqui está a documentação provisória-"

"OS HATERS VÃO TE VER"

"-para URA-4406. Observe que, ahn, não podemos-"

"VOCÊ PRECISA FAZER DE MIM REAL, FLYNNBO WALES"

"-verificar muito dela agora. Os sistemas-"

"OS HATERS PODEM, VÃO E JÁ TE VIRAM, FLYNNBO WALES"

"-estão experimentando um pouco de-"

"Cale a porra da boca!""

Flynn piscou. O secretário Estevez e o técnico Mallard estavam olhando para ele como se ele tivesse crescido uma segunda cabeça.

'… desculpas, eu… foi um longo dia. Eu preciso, ahn, lidar com um negócio." Flynn deixou os documentos com Estevez e foi embora; para seu desânimo, os sapatos de palhaço o seguiram.


DE: FMonk@SCiPnet
Para: EHolman@SCiPnet
CC: RAISA do Sítio-64
ASSUNTO: Senhoras e senhores e Flynn

PEGAMOS ELE


"os haters vão te ver, flynnbo wales"

Flynn calou a galinha.

A maior parte da RAISA do Sítio-64 havia se reunido em um círculo ao redor do disco rígido do Crocodilo, de mãos dadas. Um segundo círculo de sais sagrados era tudo o que estava entre eles e a coisa que os manteve acordados por… tempo não era real, na verdade. De pé no centro, usando uma máscara esculpida e empunhando uma faca de obsidiana, estava o diretor Klotter. Flynn, por sua vez, estava espremido entre Harold Goldman e, se você não contar a galinha fantasma, a técnica Shah.

Diretor Klotter suspirou. "Certo. Então, uma última olhada. Monk, você está com o roteiro?"

Diretor assistente Monk ergueu seus documentos. "Bem aqui, diretor. Me lembre, estamos invocando o Deus abraâmico ou Nosredna?"

"O último."

"O deus doméstico, entendi, diretor." Monk estalou os lábios. "Deve ser só isso. Me diga quando."

Diretor Klotter acenou com a cabeça, ajustando a postura dos pés. "Agora."

"flynnbo waaaaaaaaales"


Conforme instruído, os participantes apertaram as mãos uns dos outros enquanto Monk começava a recitar. As palavras eram imperceptíveis, bobeiras tênues, com forma o suficiente para serem conhecidas, mas Flynn e seus colegas de trabalho as repetiam com facilidade.

Flynn fechou os olhos e pensou em Nosredna.

Uma brisa suave soprou pelo escritório, a lenta procissão de espíritos acelerada pelo tempo. O zumbido dos servidores ficava cada vez mais fraco, mas nunca fraco o suficiente para escapar do plano de fundo. As palavras estavam mais rápidas, agora, um rio suave fluindo dos pulmões de Flynn.

Flynn fechou os olhos e pensou em Nosredna.

Algo estava queimando. Plásticos, metais, metaloides, um cheiro de ozônio, inebriante como perfume, profano como a miasma da pele esfolada de um crocodilo, colocado sobre o altar de um deus falcão. Pesado na cabeça, um preenchimento para a peça que faltava no quebra-cabeça do século. Um HDD preenchido com solda de chumbo. A barriga de uma bolsa com 72 dentes.

Flynn fechou os olhos e pensou em Nosredna.

A sala estava inundada até os ombros com carne. Carne fresca, carne moída disposta em embalos quadrados de salsicha, aptos para estourar e fazendo exatamente isso. Príons nadavam de vértebra em vértebra, o fio pelo qual Flynn teria que navegar pelo resto de sua vida. Baixo o suficiente para ficar fora de vista. Alto o suficiente para errar o crocodilo que nadava no oceano encharcado de sangue, cavando a pele de javalis e arrastando-os para baixo da água.

Flynn fechou os olhos e pensou em Nosredna.

Um trovão; os gritos clicantes de um disco rígido morrendo. Plástico rangendo, metal gemendo, discos magnéticos como vidro em um tornado. De novo e de novo e de novo.

Flynn fechou os olhos e pensou em Nosredna.

Silêncio.

O recitar de Monk cessou, assim como os sussurros ecoantes da RAISA. As mãos contra as de Flynn afrouxaram. Aleluia, o trabalho estava feito.


"Ele está bem?"

Harold Goldman balançou a mão na frente do rosto de Flynn. Nenhuma resposta. "… Acho que ele está dormindo."

"De pé? Impressionante." Priya Shah estalou a língua. "Mas… pessoas normalmente adormecem depois do ritual? Esta é a minha primeira… o que quer que vocês chamem isso."

"Não, não mesmo." Harold suspirou. "… a gente, bem, deixamos ele assim? Eu sinto que temos que fazer alguma coisa, alguma coisa ou outra."

Priya bocejou. "Talvez."

Os dois olharam para o técnico Flynn Watson. Flynn roncou de volta.

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