Entrevistador: Agente Ryan Christchurch.
Entrevistado: PdI-54112 (Paul Hagenson)
Data: Dia 45 do Liberário, 2010.
Christchurch: Ok, vamos começar. Você ativamente resistiu às nossas tentativas de fazer contato no passado, Sr. Hagenson—
PdI-54112: Paul, por favor.
Christchurch: -então, por que falar conosco agora?
PdI-54112: Por que me acusa? Todos sabem como vocês operam. Pessoas trancadas e coisas estranhas em locais secretos no mundo todo. Eu não tenho muito interesse em gastar meu tempo preso em uma gaiola. Mas, estou cansado de gastar o tempo que eu deveria estar aproveitando me cuidando para não ser pego, e recentemente descobri algo que me dá um pouco mais de…vantagem.
Christchurch: E o que seria isso?
PdI-54112: Primeiro, deixe eu perguntar para você; o que sabe sobre mim?
Christchurch: Você fundou os "Filhos de Liber" durante o mês Liberário de 1983 e os liderou desde então. Tornou-se conhecido em certos círculos por suas festas extravagantes, mesmo considerando as coisas normais que acontecem durante esse período. Também esteve envolvido em várias ocorrências anômalas durante quase todos os meses Liberários nos últimos 30 anos.
PdI-54112: Algo mais?
Um breve silêncio
Christchurch: Não. Parece que você não existe fora desse evento.
PdI-54112: Eu costumava. Estar lá fora, quero dizer.
Christchurch: Como você deixou a linha de tempo base? Criou alguma anomalia temporal?
PdI-54112: Não, não. Eu não criei isso. Sou apenas um homem comum. Era um homem rico e poderoso. Possuía uma grande companhia anônima nos anos setenta.
Christchurch: O que mudou?
PdI-54112: Câncer. Foi tratável, claro. Como disse, eu era rico. Mas você sabe como essas coisas funcionam. Você nunca é realmente curado do câncer. Está apenas em um relógio, esperando os dias até ser internado novamente. E eu já tinha 58 anos. Virou um pouco clichê, eu sei, mas tudo isso fez perceber minha própria mortalidade. Então decidi fazer algo sobre.
Christchurch: Sobre mortalidade.
PdI-54112: Por que não? Deve ter visto algumas coisas incomuns trabalhando dentro da sua Fundação. Deve saber o tipo de merda que pode descobrir por aí, se olhar com atenção.
Christchurch: Então, o que você fez?
PdI-54112: A mesma coisa que todo idiota rico faria na minha situação. Eu visitei todos os charlatões, lunáticos e feiticeiros de vodu que poderia encontrar, e ver quem poderia ter o que eu estava procurando. Então, foi nos anos setenta. Nenhum deles resolveu, claro. Mas fiquei sabendo de algo. Você acredita em algo, Sr. Fundação? Um Deus?
Christchurch: Não, não. Não realmente.
PdI-54112: Ah, mas você viu coisas, não viu? Eu posso ver isso nos seus olhos. Coisas que alegam ser deuses, ou tão próximas a eles que provavelmente humanos acreditarão.
Christchurch: Você está dizendo que encontrou um deus?
PdI-54112: Ou algo que estava perto o suficiente. Ele era velho. Morrendo, acredito, se deuses puderem morrer. O grande Liber, Deus Romano do vinho, da fertilidade e da liberdade.
PdI-54112 gesticula dramaticamente.
PdI-54112: Eu não sei se ele realmente era o que dizia ser, mas certamente acreditava nisso. Ele era amargo também. Irritado por ser esquecido. Falava sobre como seus companheiros deuses eram todos imortalizados pelo calendário ou como eles se tornaram queridinhos da cultura pop. Mas não o velho e pobre Liber.
Christchurch: Você fez um acordo com um deus moribundo.
PdI-54112: Bingo. Ironicamente, eu tinha procurado algo para tentar resolver a questão da minha mortalidade, apenas para encontrar um deus agonizante que não conseguiu resolver a sua própria. Ele não poderia me tornar imortal, mas ele poderia me dar tempo. Tempo sem fim. Uma estranha distinção, mas aí está.
Christchurch: Criando o tempo extra?
PdI-54112: Oh não, não. Acho que não. Não, acho que o tempo de repetição já estava lá. Um fenômeno natural talvez. Claro, ninguém se lembrava disso. Isso poderia estar acontecendo há séculos. Milênios até, pelo que sei. Não, ele deu lembrança às pessoas. Transformou-me em uma espécie de âncora, acho. Colocou um pouco do que sobrou dele dentro de mim. Enquanto eu existir, ele existe, e as pessoas vão lembrar do que aconteceu no último mês Liberário. Desde que eu esteja ligado a isso, eu não posso não existir. Tive que desistir da minha vida original, obviamente. Foi tudo esquecido pelo mundo. Mas valeu a pena o preço.
Christchurch: E o que esse Liber ganhou com isso?
PdI-54112: Para ser lembrado, claro. Para viver um pouco. Todos os seres de grande poder querem. Então, certifiquei-me de que o tempo extra seria nomeado em sua homenagem. Fundou os Filhos. Durante 47 dias do ano, Liber é a maior brincadeira da cidade.
Christchurch: E você passa o tempo realizando orgias e comendo comida suficiente para alimentar um pequeno país.
PdI-54112 ri.
PdI-54112: Entenda, da minha perspectiva, faz apenas alguns anos desde que tudo começou. Tudo o que você considera como tempo normal não existe para mim. Mas eu admito, esse aspecto de tudo começou a se desgastar um pouco. Não é disso que estamos aqui para falar, não é.
Christchurch: Você mencionou algo sobre vantagem. Suponho que você vai tentar nos chantagear agora.
PdI-54112: Por favor, entenda que não estou fazendo isso maliciosamente. Está realmente fora do meu controle. Mas, como disse, estou cansado de ter que me cuidar constantemente, para caso alguma Fundação continue tentando me pegar e me trancar em uma caixa. Então, espero que possamos chegar a algum tipo de acordo.
Christchurch: Estou ouvindo.
PdI-54112: Liberário é toda a minha existência. Meu impacto no seu mundo é limitado, mas não é inexistente. Você não perde nada me deixando em paz. O mundo já conhece a Fundação e todas as coisas estranhas que você lida durante o Liberário. Nenhuma das coisas "anômalas" no meu círculo é prejudicial. A maioria é apenas efeitos colaterais de ter parte de Liber dentro de mim, eu acho. Os restos de um velho deus divertindo-se.
Christchurch: Nós não perdemos nada deixando você sozinho. O que ganhamos então?
PdI-54112: Como eu disse antes, sou uma espécie de âncora agora. Enquanto estou aqui, mantenho tudo o que é-
PdI-54112 gesticula vagando pela sala.
PdI-54112: -preso. Sólido. O todo. Quando eu não estou aqui - por exemplo, quando soldados da Fundação entram em uma das minhas festas e me matam. Bem, as coisas se tornam um pouco menos sólidas.
Christchurch: O que você está insinuando?
PdI-54112: Eu vou soletrar para você. Toda vez que morri, algo ruim aconteceu. Algo grande. Eu não sei porque, talvez seja o resultado daquele último pedaço do deus vivendo dentro de mim realmente morrendo. Mas eles começaram a afetar o seu tempo. A última vez que morri, aquela tempestade na Austrália vazou e causou todo tipo de problema. Quantas pessoas morreram? Nove, dez mil? Esse foi o pior até agora, mas não foi a primeira vez.
Christchurch: Então você está mantendo o mundo como refém?
PdI-54112: Ah, não seja tão dramático. Como disse, não é intencional. Eu me senti mal quando percebi a conexão. Tomei menos riscos desde então, menos nesse caso. Mas, como eu disse, também tenho pouco interesse em ser caçado. Então aqui está o acordo. Você me deixa em paz, para cuidar do meu negócio sem nenhum custo para si mesmo ou para sua preciosa "normalidade" ou o que quer que você chame disso. E, em troca, não me matarei toda vez que achar que você está chegando perto.
Christchurch: Nós poderíamos apenas mantê-lo sedado. Colocando você para dormir toda vez que o mês Liberário começar de novo.
PdI-54112: Isso funcionaria uma vez. No próximo mês eu acordaria em outro lugar. Certamente não nas suas pequenas celas. E então você teria que me rastrear de novo e arriscar que eu fosse morto. Por que arriscar?
Após a entrevista, PdI-54112 foi sedado até a conclusão da iteração SCP-3455, com sua concordância. PdI-54112 não estava presente em sua cela designada na iteração seguinte e seu paradeiro atual é desconhecido. A alegação de que sua terminação tem uma correlação com desastres destrutivos, que afetam a linha de tempo base, foi corroborada.
A atual política operacional para PdI-54112 é apenas monitorar, mas não abordar.