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Capítulo I.XVI
Acho que me perdi do assunto. Em algum lugar aqui, esqueci que eu deveria estar escrevendo sobre histórias que meu pai me contou, e isso se transformou em histórias que eu tinha sobre meu pai. Às vezes, nem era sobre meu pai. Acho que tentei fazer um tributo, e ele começou a se tornar sobre mim. Não foi exatamente por isso que eu tinha ficado chateada com meu pai, quando ele tentou ficar me dando desculpas no funeral da mamãe? Não foi esse o comportamento que me deixou tão irritada? Bem, pode ter sido algumas coisas.
Agora eu sei que ninguém vai ler isso. Essa história não faz o que eu quero que faça. Mas apará-la, poli-la, seria insincero. Eu só tenho que aceitar que ela não é sobre meu pai. Ela é sobre mim. Acho que posso viver sendo egoísta atrás de portas fechadas. Eu não quero. Mas eu não faria nenhum favor a mim mesma se eu tentasse segurar isso.
Papai morreu em 12 de julho de 2024. Era um dia agradável e quente, e ele finalmente tirado um tempo para si mesmo para fazer uma caminhada em Sandy. Ele encontrou uma trilha no Tickle Creek e a pegou. É uma trilha plana. Nada minimamente extenuante. Mas não importa. Fosse o que fosse, seu ciclo já havia começado. Ele sofreu um ataque cardíaco e caiu de cara na água rasa. Parece que ele nunca tirou um tempo de sua agenda para fazer aquela cirurgia. Ele viveu até os 68 anos. Não uma vida curta, mas não longa. Ele deixa sua esposa, Alice, seus filhos, Anders e Robin, e sua única filha restante, Faeowynn. Eu não tenho nenhuma conclusão sólida aqui. Não tenho final bom ou ruim. Não tenho nenhum ápice não tenho nenhum epílogo. Eu não tenho fechamento.
Hoje é 16 de julho.
Trimm, trimm, trimm… trimm, trimm, trimm…
"Fae?"
"Ei, Anders."
"Ei. Se você está ligando, isso significa que você vai voltar pra casa?"
"Acho que sim."
"Maravilhoso. Mamãe e Robin têm estado muito preocupados."
"E você?"
"Um pouco."
"Desculpe."
"Não se sinta assim. Cada um lamente à sua maneira."
"Certo. Você contou a eles?"
"Não."
"Obrigada."
"Não foi nada."
"Foi sim." … "Estarei em casa em algumas horas. Tenho que fechar a conta num hotel e dirigir de volta. Só vou dizer que precisava de um tempo para mim e vim até Sandy para caminhar pela trilha e ter a experiência."
"Isso está perto o suficiente da verdade."
"É. Sério, obrigada."
"Sério, não foi problema. Você estará em casa pro jantar?"
"Eu vou. O que vai ser?"
"Acho que ninguém está com cabeça para cozinhar, vamos pedir comida chinesa."
"Parece uma boa. Você está bem?"
"Se estou indo bem?"
"Sim."
"cho que estou."
"E a Alice e o Robin?"
"Acho que ninguém chegou à fase de recuperação ainda. Dito isso, mamãe está se controlando. Robin, não."
"Hmm."
"Mas eles vão se sentir melhor com você em casa."
"Claro. Claro, estou a caminho."
"Bom. Vejo você quando eu te ver. Mamãe e Robin estão fora, você pode chegar em casa só comigo aqui."
"O que você está fazendo?"
"Assistindo Vila Sésamo."
"Ah."
"É."
"Certo, até logo."
"Vejo você em breve."
Clique.
O sol estava quente, o céu estava claro, o dia estava lindo, e eu não sentia nada disso. O lugar diante dos meus olhos era o mesmo para mim que a terra além desta cidade era para Boring. E pensar que isso existia parecia errado. Havia algum lugar onde os ratos não criam asas? Havia algum lugar que não foi afetado pela morte de Tim Wilson? Algum lugar onde as pessoas continuaram vivendo a vida normalmente? Existe? Ou foi inventado? Era difícil acreditar que havia algum momento, senão agora. Difícil acreditar que houve um antes ou um depois. Uma causa para um efeito. Qualquer coisa a fazer.
Esses eram os pensamentos que passavam pela minha cabeça a caminho de casa de Sandy, pelos bosques e estradas secundárias que já me eram então familiares. O sol brilhava em mim, mas não penetrava na pele. Eu vivia em meu próprio mundo privado, no momento. Às vezes eu encostava no acostamento da estrada quando percebia que estava me desconcentrando e temia que pudesse começar a entrar na floresta ou na pista errada.
Eventualmente, acabei ultrapassando a linha das árvore e entrando nas fazendas e campos de minha cidade. Eu não apreciei nenhuma vista enquanto descia as estradas simples e retas em direção à minha casa. Estacionei, saí e encontrei uma visão familiar. Anders estava parado na porta aberta, esperando meu retorno. Peguei minha bolsa, fechei e tranquei o carro, e me arrastei até a porta. Assim que nos encontramos, nos abraçamos.
"Fico feliz em ter você de volta em casa."
"Fico feliz por estar de volta em casa."
"Você terminou de escrever?"
"Terminei."
"Ajudou?"
"Não tenho certeza."
"Tudo bem."
"É mesmo?"
"Acho que sim."
Nos afastamos um do outro.
"Uau, Anders," eu sorri fracamente, "Eu nem sabia que você tinha calça de moletom."
Ele olhou para si mesmo. Ele estava vestindo uma camisa social, uma gravata bastante frouxa e um moletom levemente manchado. Uma observação menos bem-humorada estava em seu cheiro — ele não estava particularmente sujo, mas ele sempre teve um problema com odor corporal, e cheirava como se tivesse, por enquanto, desistido de combate-lo.
"São pijamas. Mas é ótima para deitar no sofá e não fazer nada o dia todo. Por que estamos parados na porta? Entre, eu fiz chocolate quente para nós."
"Ah, obrigada."
Entrei e segui Anders pelo arco esquerdo e entrei na sala de estar. Uma pilha dos livros de Anders estava na mesa entre o sofá e a TV, incluindo a trilogia de O Senhor dos Anéis, Mona Lisa Overdrive e Dear Fang, with Love. Cada um tinha seu próprio marcados, mas eles não estavam enfiados muito longe. O sofá também tinha um travesseiro e um cobertor amarelo e áspero.
"Esta é a sua estação?"
"Tem sido nos últimos dias. Robin está praticamente trancado no quarto dele. Alice não consegue escolher um lugar para ficar, mas ela tem passado muito tempo no quintal praticando com o boneco de esgrima. É um pouco maníaco, mas eu prefiro que ela esteja fazendo alguma coisa do que nada. É com o Robin que estou realmente preocupado." Ele se sentou e fez sinal para duas canecas na mesa de centro. Uma era marrom escuro e a outra era um branco cremoso. Eu peguei uma e dei a ele um olhar curioso.
"Experimente," disse ele.
Eu bebi, e levantei minhas sobrancelhas. "Você derreteu um dos meus chocolates nisso?"
"Não. Só encontrei um pacote sem rótulo de chocolate quente atrás de algumas latas, e ele fez isso. Você pode encontrá-lo na despensa. Caixa roxa e amarela."
"Sem rótulo?"
"Aham."
"Droga. Recentemente descobri que essas coisas não vêm da loja de doces local. Eu nunca perguntei a ele sobre isso, não tenho certeza do porquê. Ele levou esse segredo com ele pro túmulo."
"Isso ele levou. Talvez seja tudo caseiro de alguma forma."
"E ele faria algo pra mim e não pra vocês?"
Anders encolheu os ombros. "Você e uh… Tim sempre te amou mesmo, sabe."
"Mais do que…?" Eu me calei antes de terminar esse pensamento.
"Ah, não. Não, não. Eu acho que ele achava que tinha que trabalhar mais por você."
Entramos em silêncio e tomamos goles de nossos chocolates. "Você já está falando no pretérito. Achei que você deveria ter um período em que isso se torna difícil."
"Eu sei do que você está falando, mas não tenho certeza se isso é verdade."
"O que a Alice e o Robin estão fazendo?"
"Eles estão escolhendo um caixão agora. O funeral deve ser em menos de uma semana, na segunda-feira."
"Conseguimos organizar ele tão rápido assim?"
Anders sorriu, nem de forma inautêntica nem feliz. "É uma questão de "todos a postos" na Soluções Silvestres. Não estamos organizando ele sozinhos. A organização toda está ajudando."
"Uau." Outro momento durou enquanto olhávamos pela janela para as fileiras de milho além da nossa cerca. "Bem, acho que vou para o galpão. Ainda não estou totalmente sem necessidade de um tempo para mim mesmo."
"Eu te entendo."
Comecei a me levantar, minha fraca vontade alimentando pernas fracas.
"Ei," começou Anders, "devo trazer sua comida para você, ou você vai se juntar a nós para o jantar?"
"Ainda vai ter o jantar em família?"
"Eu e minha mãe, pelo menos."
Eu pensei por um segundo. "Eu apreciaria se você trouxesse para mim."
"Pode ser."
E assim fui embora. Passei pela mesa de vidro no jardim da frente, o boneco de esgrima no quintal, algumas flores que Robin estava cuidando bem, depois entrei pela porta esquerda do galpão, a porta que dava pra meu quarto. Lá, eu descarreguei minha bolsa e mergulhei de cara na minha cama. Meu braço direito de lado se estendeu em minha bolsa e pegou o tablet. Então eu rolei sobre minhas costas e o segurei enquanto ele ligava. Minha senha foi digitada. Minha tela inicial desbloqueada. meus arquivos estavam disponíveis para mim. Abri Histórias Que Meu Pai Me Contou e tudo. Ou, meus olhos passaram por cada palavras, mas eu estava perdida em minha própria cabeça. Muitas vezes, eu tive que reler um parágrafo três ou mais vezes para entendê-lo, ou desistir completamente e me deixar tagarelar sem reconhecimento ou sentimento. Foram muitas palavras. Mais palavras do que eu esperava que eu era capaz de escrever em quatro dias. Quanto que comi nos últimos dias? Quanto que bebi?
Acho que o jantar foi mais cedo do que eu esperava, porque ouvi uma batida na minha porta. Uma vez que finalmente consegui energia para me levantar, fui e encontrei um recipiente de isopor com uma nota autoadesiva em cima que dizia:
Por favor, tenha uma boa noite de sono.
-A
P.S. Você nunca viu o corpo. Se você quiser, me encontre para o café da manhã às 8:00
Coloquei a comida no frigobar e deixei ela lá. Por um momento, fiquei ao pé da minha cama, apenas segurando os postes, olhos fechados, respirando fundo. Que bem isso estava me fazendo? O que eu estava procurando?
Imaginei Tim. O homem no necrotério. O homem com a mão direita em uma caneta e a mão esquerda no peito. O fundador da Soluções Silvestres do Wilson, o imigrante californiano do Oregon, o amante de animais, o escritor de cartas, o homem que nunca apareceu. Tim, que me fez obediente, que tirou toda a luta de mim ao me dar uma casa e um emprego quando eu estava apática e à deriva. Tim, que nunca entendeu completamente meu nome ou minha feminilidade. Tim, a quem eu tinha tanto a dizer e perguntar. Tim, aquele com quem eu jamais conseguiria falar novamente.
Imaginei papai. Não Tim, mas papai. O mergulhador um pouco gordinho, baixinho, barbudo, rosto redondo, olhos castanhos, cabelos castanhos. O homem no barco. o homem sob as ondas. O homem na baía, o homem em casa. Casa em San Diego, mamãe e papai, a cidade e o oceano. Eu me enganei ao ponto de sentir o cheiro de água salgada e ouvir o tráfego intenso. Eu esqueci momentaneamente o cheiro de pinheiro, o campo de edifícios de um andar, as montanhas, os invernos frios, a estação chuvosa, os esquilo e veados e tudo mais. Me enganei a um estado de simplicidade. De quando eu não questionava o que significava ser um menino. De quando eu não sentia a necessidade de deixar mamãe na Costa Oeste. De quando eu não estava fazendo sucesso no mundo dos negócios de Nova York. Antes de tudo. Em um mundo perfeito, eu me lembraria daquele tempo antes de nascer, e imaginaria ele, mas não havia tal arquivo na memória.
Meu rosto se contorceu. Eu levantei uma mão, rocei um dedo sob meu olho. Procurei lágrimas. Mas não encontrei nenhuma.
Abri meus olhos. Eu ainda estava aqui. Eu ainda estava em Boring. A vida tinha acontecido, querendo ou não. Eu era Faeowynn. Eu estava viva. Eu era a diretora financeira da Soluções Silvestres do Wilson. Uma organização agora sem cabeça. Uma organização sob o controle dos Supervisores e cheia de animais mágicos. Minha vida era absurda. Meu presente era tão dominante sobre o passado que eu sentia como se ele nunca tivesse acontecido.
O que quer que eu estivesse procurando, não estava naqueles arquivos, e não podia ser confinado em palavras.
Abri meu tablet, apaguei o documento, e o coloquei de volta na bolsa. Deitei de lado sobre minhas cobertas e fechei as persianas sobre as janelas. A noite inteira, eu estava bem acordada naquela praia, as ondas recuadas, a cidade evacuada. A noite inteira, olhei para o horizonte, onde a água era visível, mas tão distante. Caminhei por um deserto, a costa recuando a cada passo que tentava se aproximar, como uma miragem que você nunca consegue alcançar. Eu era aquela casa. Minhas vidraças estavam batendo, minhas janelas ameaçando quebras, minha porta mal segurando-se em suas dobradiças, e ainda assim ela permanecia inteira. O furacão prometeu me rasgar, mas eu não rasgava. Ele prometeu me transformar em pedacinhos, mas eu não era transformada. Ele queria me aplanar, mas eu não era aplanada.
Eu queria deixá-lo, mas eu não conseguia.
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